Ricardo Holanda – (Coordenador do Curso de Comunicação Social na Universidade Gama Filho.)

Recordar é Viver!

Se, como atesta o dito popular e o refrão de famosa modinha de carnaval, recordar é viver, então eu tenho muito porque viver. Nasci no bairro da Tijuca no período pós-guerra, final da década de quarenta. E, por lá, como espectador do cotidiano, assisti e vivenciei com admiração a beleza daquele bairro, que em seu esplendor possuiu 17 cinemas! Mais salas de projeção que a famosa Cinelândia, no centro da cidade. Só do Grupo Severiano Ribeiro havia 10 cinemas.

Os nomes ainda estão em minha memória: Eskye, Carioca, Metro Tijuca, Tijuca, América, Rio, Olinda, Art Palácio Tijuca, Britânia, Bruni Tijuca e Bruni Saens Pena (estes chegaram na década de sessenta), Comodoro, Madrid, Sto Afonso, Cinema 3, Coper e Tijuca Palace (famoso pela programação de filmes de nouvelle vague). Só na Praça Saens Pena havia uma concentração de 08 salas de projeção, todas de frente para a rua!

Todo esse esplendor e magnitude apresentados pelos cinemas da época eram referenciados pelo Grupo Severiano Ribeiro. Ir ao cinema era um ritual, até porque estar na sala de espera enquanto a guardávamos a abertura das portas que franqueavam o acesso à sala de projeção, significava contemplar o esplendor e bom gosto da arquitetura de interior que esses cinemas ofereciam ao seu público. Os espaços decorados ao estilo art decó eram ornamentados por grandes espelhos e finalizados em mármore Carrara. Um luxo, que caracterizou uma época de grandes cinemas e de muito público. A televisão ainda não havia chegado.

Foi o período em que o Jornal da Tela, produzido semanalmente pelo Grupo Severiano Ribeiro, transmitia imagens com a locução de narradores como Heron Domingues e Gontijo Teodoro. Antes da exibição do filme programado, assistir ao Jornal da Tela fazia parte desse ritual de ir ao cinema. O programa tinha que ser completo.

Além de ter sido o bairro carioca com maior número de cinemas no Rio de Janeiro, então capital federal, a Tijuca também abrigava os estúdios da Atlântida na rua Hadock Lobo. Não é exagero afirmarmos que parte significativa da memória visual da Tijuca foi preservada pelas famosas chanchadas porque, em sua maioria, tiveram como locação a Tijuca e seus arredores.

Não havia como escapar, o tijucano estava impregnado por essa atmosfera. De um lado a beleza e a majestade de seus cinemas e, de outro, a efervescência que caracterizou os trabalhos de produção de filmes pela Atlântida Cinematográfica. Artistas, coadjuvantes, músicos e figurantes circulavam com desenvoltura naquele bairro. Entre tantos artistas, lembramos de Oscarito, Grande Otelo, Cyll Farney, Fregolente, Renato Rostier, Eliana, Adelaide Chiozzo, Zezé Macedo, Wilson Grey, José Lewgoy e Hugo Carvana (ainda em seus 17 anos) que freqüentando os estúdios na rua Hadock Lobo, podiam ser vistos no entra e sai das gravações.

A cidade e o país devem um tributo permanente à figura de Luiz Severiano Ribeiro. Graças ao seu estilo empreendedor a cultura nacional foi disseminada em suas salas de projeção durante décadas e , com marcas profundas em nosso imaginário.

Recordar é viver…